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quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

LIGA NÃO! ELA É POETA





LIGA NÃO! ELA É POETA.

Ysolda Cabral

O Sol pairava soberano sobre todas as coisas lá fora. Ao sair, constatei que, além de estar lindo, ele estava quente como nunca o senti assim em minha pele. A princípio gostei! É que estava numa sala com uma central de ar-condicionado que gelava até os ossos. Coisas de extremos nunca dão certo... Eu sempre soube disso.

Em questão de minutos, procurei uma presilha na bolsa para prender os cabelos. Encontrei-a mas não consegui prendê-los e o fato me exasperou: "Por que diabos corto os cabelos e por que diabos eles crescem tão rápido?"

O Vento, por sua vez, ressabiado com o Sol a lhe deixar fervendo, resolveu se juntar à presilha e me dificultar a vida no meu quase meio dia. "Parece até brincadeira! Que coisa medonha!"

Joguei a presilha fora e peguei um diadema. Eu sempre os trago comigo para as emergências - coisa de quem mal cortou os cabelos e eles já estão crescendo, totalmente sem corte e sem jeito. Mas ao tentar colocá-lo ele se partiu em dois.

A essas alturas estava em tempo de ter um ataque... E, com mais de meio caminho andado, pensei em voltar.

Voltei foi no Tempo! Aos 23 anos, com um cabelo abaixo da cintura, num dia assim, sem presilha e sem diadema, mandei um dos mais badalados cabeleireiro do Recife me livrar do incômodo e ele, todo prosa, mandou ver. Saí de lá quase sem cabelo, além de falida para alguém que ganhava muito pouco, enquanto ele, com certeza, ganhara uma peruca nova para cobrir a careca que brilhava sob a luz dos lustres... 

Bem feito pra mim! Lembro que meu cabelo passou uma eternidade para crescer novamente. 

Neste ponto de minhas recordações aleatórias, cheguei à conclusão de que tudo estava em sentido contrário àquilo que deveria ser. Ou seja: meu cabeleireiro de agora, deveria ter cortado os meus cabelos naquele tempo e o daquele tempo deveria te-los cortado agora... 

Sorrindo do pensamento, entrei no restaurante de todo o dia. O pessoal, desconcertado e surpreso com o meu estado de desalinho e exasperação, perguntou se eu estava bem. 

Claro que eu estava bem, a não ser pelo meu cabelo! Contudo, não respondi... Achei mais prudente guardar os meus pensamentos para mim mesmo. 

Foi quando escutei alguém falar: 



- Liga não! Ela é poeta!







Recanto das Letras 
Em 23.01.2014 
Código do texto: T4662266